O Segredo Dentro da Taça

O Segredo Dentro da Taça

O Segredo Dentro da Taça - Crônica escrita por Fernanda Casanova

Publicado em: 23/11/2024 às 15:59

O segredo dentro da taça

 

Já faz algum tempo que o consumo de vinho no Brasil aumentou. De fato, temos muitas opções para atender diversos paladares e tamanhos de bolso. Vinhos brasileiros, vinhos importados, vinhos naturais, vinhos de uva de mesa, vinhos finos... eu poderia perder a noite enumerando a possibilidade de nomes estranhos que o homem criou para enfeitar a embalagem do presente. Temos ainda os espumantes que se misturam com os moscatéis e assim por diante.... bebidas tão belas e deliciosas que deveria haver um estudo mais profundo do impacto que poderiam causar em nossos corações.

Mas aí veio alguns homens, falo alguns porque não são todos, encher de regras e detalhes algo que deveria ser simples: apreciar o verdadeiro líquido de acordo com o gosto e alcance de cada um. Só na divisão de uvas viníferas, o homem catalogou mais de 5.000 tipos. E sobre as sensações organolépticas, o que dizer? Até mesmo aqueles que se dizem entendidos não sabem diferenciar a acidez de um vinho de sua adstringência...Cheguei a testemunhar gente doida pedindo vinho tinto seco suave...achei engraçado. E tem aqueles que se o espumante não for Nature, meu Deus, é uma desgraça...traduzindo a palavra desgraça: sem graça. Então seria um líquido sem graça? Será?

E cada vez mais as pessoas vão se enrolando em seus ideais tão sólidos quanto o gelo que derrete na estrada. Vinho bom é o que tem garrafa pesada! Vinho bom é o que passa por barrica! Vinho bom é caro! Vinho bom tem o rótulo que me agrada! E o que dizer dos processos enológicos jogados ao vento para capturar a pobre alma do consumidor despreparado e louco por pirotecnia em forma líquida. Ah se eu pudesse falar umas verdades... mas tenho medo da perseguição alheia.

Nunca pensei que tivesse que saber tanta coisa para beber aquilo que gosto. Mas queria saber se o gosto das pessoas é realmente genuíno, tenho dúvidas. Ah os ovos de concreto, as ânforas, o fundo do mar... todos agora protagonistas de uma breve história do tempo de detalhes não tão importantes assim.

E o que dizer do tão famoso julgamento de Paris? Serve de exemplo que o mais importante é o que estava dentro da taça... claro que estou trabalhando com a ideia de que a história contada foi verdadeira. E vou contar uma breve história que vai nos ajudar ainda mais na reflexão do assunto. Certo dia, num dado local, foi servido um líquido em taças para a mais alta elite entendida sobre vinhos. Prefiro não citar a profissão e nem a cidade onde ocorreu tal estudo... Naquela noite foi feita a pergunta para todos o que seria aquele líquido. Pensaram, refletiram, cheiraram várias vezes. Alguns disseram ser vinho fino doce, outros um vinho licoroso, um vinho fino meio doce e assim por diante... Para a surpresa, era apenas catuaba.

Eu me pergunto na vida...por quantas “catuabadas” o ser humano vai passar até o encontro com o Deus Baco. Prefiro seguir a vida bebendo histórias e apreciando meus vinhos de forma mais modesta... até o dia de encontrar meu verdadeiro Deus.

Crônica escrita por Fernanda Casanova

(Fernanda é formada em Administração de Empresas, Queijista e trabalha diretamente com vinhos na Angheben desde 2017. Considera vinho a melhor bebida do mundo e nas horas vagas escreve poesias e crônicas).